30 de junho de 2012

Catolicismo no Brasil em Declínio: os dados do Censo de 2010





"Os dados (do Censo Demográfio de 2010) indicam que o Brasil continua tendo uma maioria católica, mas se a tendência apontada nesse último censo continuar a ocorrer teremos em breve uma significativa alteração no campo religioso brasileiro, com impactos importantes em vários campos', analisa Faustino Teixeira, professor e pesquisador Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião – UFJF,

Segundo ele, "com base nos dados do censo agora apresentado, os cristãos configuram 86,8% da declaração de crença". Mas, observa o teólogo, "isso pode ser problematizado com a questão complexa da múltipla pertença ou então da malha larga do catolicismo, que envolve, como diz Pierre Sanchis a presença de “muitas religiões” em seu interior.

Eis o artigo.

Os dados que acabam de ser apresentados pelo IBGE com respeito às religiões brasileiras no Censo Demográfico de 2010 confirmam a situação de progressivo declínio na declaração de crença católica. Os dados apresentados indicam que a proporção de católicos caiu de 73,8% registrados no censo de 2000 para 64,6% nesse último Censo, ou seja, uma queda considerável. Trata-se de uma queda que vem ocorrendo de forma mais impressionante desde o censo de 1980, quando então a declaração de crença católica registrava o índice de 89,2%. Daí em diante, a sangria só aumentou: 83,3% em 1991, 73,8 % em 2000 e 64,6% em 2010. O catolicismo continua sendo um “doador universal” de fiéis, ou seja, “o principal celeiro no qual outros credos arregimentam adeptos”, para utilizar a expressão dos antropólogos Paula Montero e Ronaldo de Almeida. A redução católica ocorreu em todas as regiões do país, sendo a queda mais expressiva registrada no Norte, de 71,3% para 60,6%. O estado que apresenta o menor percentual de católicos continua sendo o do Rio de Janeiro, com 45,8% (uma diminuição com respeito ao censo anterior que apontava 57,2%). O estado brasileiro com maior percentual de católicos continua sendo o Piauí, com 85,1% de declarantes (no censo anterior o registro era de 91,4%). Os dados indicam que o Brasil continua tendo uma maioria católica, mas se a tendência apontada nesse último censo continuar a ocorrer teremos em breve uma significativa alteração no campo religioso brasileiro, com impactos importantes em vários campos.

O novo censo aponta um dado que já era previsível, a continuidade do crescimento evangélico no Brasil. Foi o segmento que mais cresceu segundos os dados agora apresentados: de 15,4% registrado no censo de 2000 para 22,2%. O aumento é bem significativo, em torno de 16 milhões de pessoas. Um olhar sobre os três últimos censos possibilita ver claramente essa irradiação crescente: 6,6% em 1989, 9,0% em 1991, 15,4% em 2000 e 22,2% em 2010. O Brasil vai, assim, se tornando cada vez mais um país de presença evangélica. Há que sublinhar, porém, que a força desse crescimento encontra-se no grupo pentecostal, que é o responsável principal por tal crescimento, compondo 60% dos que se declararam evangélicos (no censo anterior, o peso decisivo no crescimento dos evangélicos, em 15,44% da declaração de crença, foi dado também pelo pentecostais, que sozinhos mantinham 10,43% do índice geral evangélico). Os evangélicos de missão não registram esse crescimento expressivo, firmando-se em 18,5% da declaração de crença evangélica.

Os “sem religião”, que no censo de 2000 representavam a terceira maior declaração de crença no Brasil mantiveram o seu crescimento, ainda que em ritmo menor do que o ocorrido na década anterior. Eles eram 7,28% no censo de 2000 e subiram agora para 8% (um índice que comporta mais de 15 milhões de pessoas), e o seu registro mais significativo continua sendo no Sudeste. Esse crescimento não indica, necessariamente, um crescimento do ateísmo, mas uma desfiliação religiosa, um certo desencanto das pessoas com as instituições religiosas tradicionais de afirmação do sentido. Reflete um certo “desencaixe” dos antigos laços, como bem mostrou Antônio Flávio Pierucci em suas pesquisas.

Os espíritas também seguem crescendo. Os dados do censo de 2010 indicam um crescimento importante, com respeito ao censo anterior: de 1,3% para 2%. São agora cerca de 3,8 milhões de adeptos declarantes. Trata-se do núcleo que tem os melhores indicadores de educação, envolvendo o maior número de pessoas cm nível superior completo (31,5%). Os dados apontados pelo censo são importantes, mas há que lembrar a presença de uma “impregnação espírita” na sociedade brasileira que escapa à abordagem estatística. Isso os estudiosos do espiritismo têm mostrado com pertinência. As crenças e práticas espíritas têm uma alta “ressonância social”, transbordando a dinâmica de vinculação aos centros espíritas.

Quanto às religiões afro-brasileiras, tanto a umbanda como o candomblé mantiveram-se no eixo de 0,3% de declaração de crença. Não houve mudança substantiva com respeito ao censo anterior, que indicava a porcentagem de 0,26% para a umbanda e 0,08 para o candomblé.

Com respeito às outras religiões, permanecem com uma representatividade pequena que em sua soma geral não ultrapassa 3,2% de declaração de crença. Mantém-se viva a provocação feita por Pierucci em artigo escrito depois do censo de 2000 sobre a diversidade religiosa no Brasil, de que o Brasil continua hegemonicamente cristão, e a diversidade religiosa – ainda que em crescimento -, permanece apertada em estreita faixa um pouco acima de 3% da declaração de crença. Com base nos dados do censo agora apresentado, os cristãos configuram 86,8% da declaração de crença. Não há dúvida que isso pode ser problematizado com a questão complexa da múltipla pertença ou então da malha larga do catolicismo, que envolve, como diz Pierre Sanchis a presença de “muitas religiões” em seu interior.

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/511028-catolicismo-no-brasil-em-declinio-os-dados-do-censo-de-2010

Em marcha, a transformação da demografia religiosa do país


"Liderada pela Renovação Carismática e apoiada na criação de redes de TV e no evangelismo midiático, a reação católica à expansão pentecostal fracassou", analisa Ricardo Mariano, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 30-06-2012.

Segundo ele, "causa surpresa o declínio, em números absolutos, de Congregação Cristã no Brasil e Universal do Reino de Deus. Elas perderam, respectivamente, 200 mil e 228 mil adeptos. Até então, só uma grande evangélica, a Luterana, havia declinado, o que se explica por ser uma denominação de tradição étnica pouco dedicada ao proselitismo".

Eis o artigo.

O Censo confirma as tendências de mudança radical da demografia religiosa nas últimas décadas: queda da hegemonia católica, avanço vertiginoso dos evangélicos e diversificação religiosa pela Renovação Carismática e apoiada na criação de redes de TV e no evangelismo midiático, a reação católica à expansão pentecostal fracassou.

O inchaço da categoria "evangélica não determinada" reduziu artificialmente o crescimento pentecostal. Mostra limitações do Censo, mas também pode estar sinalizando a expansão da privatização religiosa nesse grupo, situação em que o crente mantém a identidade religiosa e a crença, mas opta por fazê-lo fora de instituições.

Tal privatização resultaria da massiva difusão do individualismo, da crescente busca de autonomia em relação aos poderes eclesiásticos, à imposição de moralidades tradicionalistas, aos elevados custos do compromisso religioso. Ela pode ter ocorrido, em especial, entre indivíduos dos grupos mais beneficiados pelo crescimento da renda e das oportunidades no mercado de trabalho e no ensino superior.

O Censo também reitera o crescimento do pentecostalismo na base da pirâmide social: 64% dos pentecostais ganham até um salário mínimo, 28% recebem entre um e três salários, 42% têm ensino fundamental incompleto. Avança nos segmentos mais vulneráveis da população, nas periferias urbanas e regiões mais violentas, nas fronteiras agrícolas do Norte e do Centro-Oeste, onde a presença católica é rarefeita.

Causa surpresa o declínio, em números absolutos, de Congregação Cristã no Brasil e Universal do Reino de Deus. Elas perderam, respectivamente, 200 mil e 228 mil adeptos. Até então, só uma grande evangélica, a Luterana, havia declinado, o que se explica por ser uma denominação de tradição étnica pouco dedicada ao proselitismo.

Parte da "queda" (improvável, cabe frisar) da Congregação e da Universal decorre da indefinição da identidade denominacional de 9,2 milhões de evangélicos. Mas há outras hipóteses.

Fiel aos princípios de não fazer uso proselitista de mídias e não apelar para a oferta sistemática de serviços mágico-religiosos, a Congregação perde competitividade.

Já a Universal tem sido fortemente pressionada por igrejas que passaram a clonar seus métodos, especialmente a Mundial do Poder de Deus, liderada por Valdemiro Santiago (315 mil adeptos). Pela TV Record, Edir Macedo já acusou o golpe, ao atacar ferozmente o oponente, que, tal como Silas Malafaia, passou a ser estrategicamente apoiado pela Rede Globo.

Seus megatemplos desfavorecem uma sociabilidade fraternal e comunitária. E a ênfase na oferta ritual de soluções mágicas faz com que muitos frequentadores ajam mais como clientela flutuante. Eles pagam por serviços recebidos, mas refutam compromissos duradouros.

A Universal carece da capacidade de formar comunidades e da pregação de uma teodiceia redentora de longo prazo. É o que se propõem a fazer várias independentes sob o grande guarda-chuva "Assembleia de Deus".

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/511030-em-marcha-a-transformacao-da-demografia-religiosa-do-pais

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